CADÊ?

abril 29, 2008

Pra mim não chega*

"Primeiro, o livro foi boicotado pela ex-mulher de Torquato Neto, impedindo a sua publicação pela Editora Record. Depois, por intelectuais ciumentos e ressentidos do Piauí. Agora, o ex-secretário de Cultura José Elias Arêa Leão me confessa que vasculhou as principais livrarias de Teresina e não achou. Eu mesmo, somente consegui ler graças ao cartunista paranaense Solda, que me presenteou com um exemplar, o qual eu tenho passado sempre adiante. É uma vergonha. A biografia escrita pelo paranaense Toninho Vaz é excelente e imperdível. Pra mim não chega. Vou continuar falando desse livro, neste blog, sempre recomendando aos leitores. Desculpem o mau jeito. Albert Piauí."

* Extraído do blog de Albert Piauí, publicado em 10 de abril. A postagem também foi reproduzida, em 13 de abril, por Kenard Kruel, que deu o título aqui também inserido.

abril 24, 2008

O amor é possível*

Ela mirou a Cyber-shot para o seu rosto uma, duas, três, quatro vezes, enquanto ele sorvia o açaí que lhe tinha sido servido. A cada foto, ela, sorridente, mostrava-lhe o feito. A contragosto, olhava-a. Findo o açaí, levantou-se, com ela seguindo-lhe à distância, contrariada.
Quando ela disse-lhe que a esperasse e ameaçou transformar comprar em verbo irregular, suprimindo as primeiras pessoas do singular e do plural, parou, abraçou-a, tentando entrelaçá-la, e beijou-a.

* Conto extraído do blog Confraria Tarântula, postado em 16 de abril.

abril 16, 2008

Música piauiense na internet

É muito comum encontrar-se em blogs álbuns há muito fora de catálogos e que sequer foram veiculados em CDs, além, obviamente, daqueles recentemente lançados, com links para downloads.
O fato é que o blog, inicialmente destinado a diários, anotações pessoais, ampliou-se e pôs pimenta na discussão acerca de direitos autorais.
Por aqui, nesta terra tórrida, Geraldo Brito, sei, tomou a iniciativa de disponibilizar o seu Maracatou no Som Barato. E no Batumaré Contra Maré e-Zine você encontra alguns álbuns que aconteceram, ou acontecem, no cenário musical do Piauí, afora gravações que não foram comercializadas, como Validuaté ao vivo no Circo Los Angeles. Alguns registros raros. Contudo, vale a pena seguir o conselho do blog: caso o álbum esteja disponível para compra, o visitante deve adquiri-lo.

abril 12, 2008

Helena

Ao contista J. L. Rocha do Nascimento

"Não é por que sei que ela não virá que não vejo a porta já se abrindo"
Meu mundo ficaria completo (com você), por Nando Reis


A princípio, bêbado, o peso do mundo sobre sua cabeça, enquanto na cama, o torpor, e a evocação de Helena. Chamou-a até dormir. E teve a impressão de que ela viera, em sonho. Linda, estava como da última vez que a vira. Pareceu-lhe que reatada a linha do tempo, abruptamente interrompida com o sumiço de Helena. Ou tudo teria sido realidade? Sentia o sabor do batom que Helena costumava usar. O costado da mão convenceu-lhe do sonho.
Então, no dia seguinte, um amigo deu-lhe notícia de Helena. Estava na cidade, para casar com um colombiano de nome Pablo. Disfarçou o desapontamento, dizendo que agora ela cantaria boleros em espanhol impecável. O jornal, atirado pelo amigo, foi duro golpe. Ali estava ela, feliz. Foi para casa, e ouviu La Puerta repetidamente, ignorando brados de vizinhos, impassível, absorto na imagem daqueles olhos felizes e amendoados. E naquele dia não dormiu propositadamente, para sonhar com Helena, que esteve presente com ele a noite toda, revirando a cama e queimando lençóis, e, ao sol parir, aflautando canções de Chico, como costumeiramente fazia nas manhãs, depois de noites báquicas.
Então, escreveu: “Não dormi. Helena também não.”
Não procurou Helena. Nada, nada mesmo, tinha a lhe falar. Disse a si mesmo: estava morta. Evitou os jornais por uns dias. Debruçou-se sobre o projeto pendente, por horas a fio, todos os dias, varando a noite frente ao Autocad. E a vida seguiu seu curso, com mudanças de estações e com Maria, Rosângela, Eliza, Ana, Alice, Sônia, Edna, Lindalva, Carol, Sueli, Jaqueline, Luciana, Luíza, Teresa, Marta e...
Bêbado, em uma noite, lembrou-se de Helena. Evocou-a até adormecer. E Helena veio. Com ela, a chuva. Viram-na lavar a janela, e desenharam desejos no frio do vidro. Da varanda, viram, enublado, o rio, e dele não exalava a fedorentina de sempre. A cidade acordava quando ela foi embora. Viu sua imagem desfazer-se no canto do quarto, com a certeza de que sonhara. Depois, adormeceu com o cheiro de sexo emanando de seu corpo. Acordou pelos toques do telefone. Tarcísio, excitado, perguntou-lhe se já tinha visto o jornal. Não, respondeu. Então, soube que Helena estava na cidade, com o marido e a filha, Maria. Agradeceu ao amigo. Sonolento, mas praguejando por ter sido acordado para uma notícia que já sabia, pegou os jornais. Todos anunciavam a estadia de Helena na cidade. A mãe, doente, interrompera a administração da família em próspero comércio. Brincou com a situação. Disse que lamentava não ter sido poeta romântico, e morrer, depois de contrair a mycobacterium tuberculosis, apaixonado.

abril 09, 2008

Frustração

Ato I. Entrada, linda, majestosa, perfumada, sexy.
Ato II. Agradável, insinuante, sussurante, sexy.
Ato III. Embriagada, sedutora, excitante, sexy.
Ato IV. Música, meia-luz, sofá, vestida, sexy.
Ato V. Nua, cicatrizes, gorduras, náuseas, baranga.
Ato finale. Noite, táxi, bêbado, dormir, solitário.

abril 07, 2008

Poty I

Por Rogério Newton

Sentado na cadeira de espaguete, o homem olhava a correnteza, que já havia transposto as muretas e alcançado a maior parte da área onde ficavam as mesas. Dentro da água rumorosa, o poste com a placa: Restaurante Pesqueirinho.

Gentil, perguntou-me:

— Pode me dar um pouco da sua atenção?

— Sim.

— Está vendo aquela árvore? Tem mais de cem anos – apontou a marmorama curvada, numa lagoa de água barrenta.

Fiz várias fotos.

— Como o senhor está se sentindo vendo a água tomar conta de tudo?

— Só estou pensando na árvore.

Levou-me para ver a cozinha, com água nas canelas do cozinheiro. Peixe frito chiando na chapa.

— Só vamos parar se a água chegar no cachimbo do fogão.

Corte para meninos sobre canoas ancoradas onde fora rua. Balançavam.