CADÊ?

maio 29, 2008

A herança de cada um*

Eles, aos berros, agrediam-se. Gérson, o caçula, sangrava já. A mãe, antes buscando apartar os filhos, agora retinha-se no sofá, mirando um ponto qualquer no céu, pela varanda, como se estivesse sozinha. Os dois, pensava mais uma vez, nunca se uniriam. Afinal, Lucídio, pai de Lucas, e Geraldo, pai de Gérson, foram inimigos até a morte.
A mãe levantou-se e dirigiu-se à varanda. Olhou o céu, e, como se o desprezasse, buscou a terra.
Os filhos, ainda hoje, agridem-se por qualquer bobagem. A mãe não esboça qualquer gesto para separá-los, presa à cadeira de rodas e ao passado. Ontem, porém, Lucídio visitou-a à noite, enquanto dormia, com a marca de corda no pescoço, prometendo retornar. As mãos tremeram e o rosto contraiu-se ao lembrar que ele a chamara de assassina.
Precisava encontrar um meio de afastar pelo menos o fantasma.

* Conto extraído do blog Confraria Tarântula, postado em 16 de maio.

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