Fora da ironia, não há salvação. É a partir desse lema que o polêmico escritor, professor e jornalista gaúcho Juremir Machado da Silva baseou seu novo romance, Solo, uma crítica ácida à sociedade espetacular. Com referências que pulam de James Joyce ao Louro José, de Guy Débord ao Domingão do Faustão, Machado traça o painel de uma pós-modernidade tragicômica, em que todas as crenças desmoronaram.
– Apenas com a ironia podemos reagir ao absurdo do mundo midiático – afirma o escritor, de 46 anos. – É difícil buscar um sentido. Algumas pessoas se contentam com soluções fáceis, como religiões ou buscas espirituais e de auto-iniciação. Mas os espíritos mais exigentes sempre se sentirão inadequados. Tudo lhes parecerá ridículo.
Solo conta a história de um publicitário bem-sucedido e inteligente, que decide emburrecer-se gastando seu tempo em frente à TV. Seu roteiro televisivo inclui desde a TV Senado até as reportagens do Canal Rural (“Uma das minhas grandes alegrias foi a criação de um novo canal, o Premiere Rural”, diz o irônico personagem).
Abandonado pela mulher, entra numa crise existencial, dividido por duas forças opostas: a inércia intelectual e a consciência crítica. Apoiado nos clássicos da teoria da comunicação, está sempre disparando observações cultas e espirituosas sobre a imbecilidade que o cerca. Só que nunca se afasta dela. Por mais que critique Ana Maria Braga e o seu jeito “lipoaspirado, rediagramado e otimista de falar besteira”, não consegue deixar de assisti-la. Inevitavelmente, acaba misturando Paulo Coelho com James Joyce. E compara as pegadinhas do Faustão com as fábulas de Esopo e La Fontaine (“O Domingão do Faustão tem um grande valor na pedagogia construtivista e piagetiana”, brinca).
– O personagem é um pouco como todos nós – sugere Machado. – Resiste à imbecilidade da sociedade do espetáculo, mas não completamente, pois está sempre se comportando sob influência dela. É como aquele salgadinho que comemos mesmo sabendo que faz mal.
Pastiche de Paulo Coelho
Atormentado por sofrimentos e dúvidas (e pesadelos que o transportam à Revolução Federalista de 1893), o personagem viaja o mundo em busca de autoconhecimento, a chamada “jornada de iniciação”. Como bom brasileiro, vai primeiro à Europa, depois volta para a América Latina, numa ego-bad-trip do Rio de Janeiro a Machu Picchu. É a oportunidade para Machado satirizar o espiritualismo de butique contemporâneo, alfinetando escritores neo-esotéricos como Paulo Coelho.
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