CADÊ?

outubro 14, 2008

Que sorte, hein?

Tá. Admitamos que você é um desinformado, ou, se for o caso, desleixado mesmo. Nem assistiu ainda 007 - Cassino Royale, o primeiro da série com Daniel Craig no papel de famoso agente britânico, dirigido por Martin Campbell, em que o súdito da Rainha da Inglaterra enfrenta o vilão russo Le Chiffre, visando principalmente quebrar a banca de seu cassino.
E aí, já que está na locadora de dvds, e como já se fala do próximo filme do agente mais famoso da Rainha , você vê o Cassino Royale, e, desatento, sem se deter na capa, resolve locá-lo.
Vai continuar, meu caro, sem assistir o 007 - Cassino Royale, com Daniel Craig. Mas, tenha certeza, você tirou a sorte grande. O filme que você locou é dirigido por Val Guest, Ken Hughes, John Huston, Joseph McGrath e Robert Parishs, com música de Burt Bacharach, e tem um elenco estelar: Peter Sellers (Evelin Tremble / James Bond); Ursula Andress (Vesper Lynd / 007); David Lean (Sir James Bond); Orson Welles (Le Chiffre); Joanna Pettet (Mata Bond / 007); Woody Allen (Jimmy Bond); Deborah Kerr (Agente Mimi); William Holden (Ransome); Charles Boyer (Legrand) John Huston (McTarry / M); Kurt Kasznar (Smernov); George Raft (George Raft); Jean-Paul Belmondo (Legionário francês); Terence Cooper (Cooper / 007); Barbara Bouchet (Moneypenny); Gabriella Licudi (Eliza); Tracey Crisp (Heather); Elaine Taylor (Peg); Anna Quayle (Frau Hoffner) e Peter O'Toole (Piper).
Segue resenha de Marcelo Hessel, extraído do site Omelete:
"A típica comédia da contracultura, característica dos lisérgicos anos do flower power, termina com uma algazarra com todos os personagens, banho de espuma, bolas de sabão, corre-corre e alguns animais selvagens que não se sabe de onde saíram. É assim em Um Convidado bem Trapalhão (1968), por exemplo. E foi igualzinho, um ano antes, em Cassino Royale.
A base do roteiro é a primeira história do espião, publicada em 1953 pelo jornalista e escritor londrino Ian Fleming (1908-1964), a única que não havia sido comprada pela EON Productions (detentora dos direitos dos demais romances e dona da série oficial no cinema). Com os direitos vagando à deriva, o produtor Charles K. Feldman, depois de oferecer Cassino à EON e receber uma negativa, decidiu conduzir uma produção independente. Em 1967, ano em que também sairia Com 007 só se vive duas vezes, James Bond já tinha quatro filmes no currículo. Era o suficiente para consolidar a mitologia do espião - e é justamente ela que Cassino Royale satiriza.
O ator David Niven a certa altura do filme ironiza: Agente secreto virou sinônimo de maníaco sexual!. Niven interpreta Sir James Bond, o verdadeiro e único 007, que decidiu se aposentar por desgosto. Diante de tantas tralhas de loja de brinquedo e rastros de mulheres
mortas
, em suas palavras, ele não vê mais motivo para ser espião durante a Guerra Fria. Mas acabam convencendo-o, e lá vem de novo Bond trabalhar a serviço da Rainha.
Duas características básicas de 007, o seu apetite sexual e o fato de todo mundo conhecê-lo (ainda que devesse ser secreto), são as bases de boa parte das piadas. O Sir Bond de Niven inventa uma maneira de enganar os inimigos: todos os espiões agora, homens ou mulheres, deverão se chamar James Bond - 007. Assim ninguém saberá quem é o verdadeiro. E esses escolhidos deverão passar por um teste: resistir ao charme de uma série de mulheres para não se deixarem enganar pelas vilãs de verdade. A cena do treinamento pelo qual passa Terence Cooper, aplicando golpes de judô em mulheres deslumbrantes e sedutoras, é hilária.
Símbolos sagrados da franquia são totalmente desmoralizados. O verdadeiro nome de M, por exemplo, descobre-se na comédia. Ele é escocês, se chama McTarry, e suas onze filhas têm entre 16 e 19 anos. Ursula Andress, a primeira Bond-girl oficial, também aparece no filme, parodiando a si mesma no papel de Vesper Lynd. E há, claro, autorizados pelo remendo do roteiro, uma série de Jamezes Bondes. Além de Niven e Cooper, Peter Sellers também o interpreta, com o talento de sempre (e com direito a gag de sotaque indiano). E tem Woody Allen tipicamente frenético, como o sobrinho do espião, Jimmy Bond.
Sequências impagáveis: Mata Bond, a filha de James com Mata Hari, entrando no QG alemão decorado em estilo Cinema Expressionista; o quase fuzilamento de Woody Allen; os números de mágica de Orson Welles no cassino. Aliás, a interpretação de Le Chiffre de Welles é a melhor coisa do filme. Nos bastidores, ele e Sellers não se bicavam. O ator inglês exigiu que suas cenas à mesa fossem rodadas em dias separados, para que ele não cruzasse com Welles no set. O jeito de resolver foi filmar tudo com plano e contraplano puro. A cena inteira é antológica - poucas personalidades de Hollywood sabiam rir de si mesmas como Welles.
A disputa de baralho é um dos poucos momentos em que o filme é realmente fiel ao livro. De Cassino Royale, o romance, o longa não deve ter nem meia hora, dentro de seus 130 minutos totais. Uma salada, caríssima. Não por acaso, a lista de roteiristas creditados, oficialmente três, cresce violentamente se contado o número de pessoas que escreveram cenas e gags individuais ou deram seus pitacos. E de um filme com cinco diretores - o grande John Huston à frente - só se espera mesmo muita mistura. Para encerrar os vaivéns e as pontas soltas, dar algum fecho ao nonsense, só mesmo um final como o descrito lá em cima."
Que sorte, hein?

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