CADÊ?

julho 09, 2008

Impressões de um leitor: o encomendador de almas

Diabos!!! Vi O encomendador de almas, de Danilo Damásio, logo que lançado, na vitrine da Livraria Universitária. Folhei-o, e o abandonei de pronto. Afinal, que valor, supus, teria um livro que, a pretexto de apresentá-lo, serviu de tantas personalidades piauienses, quando muitos deles, certamente, abominam a literatura, e outros, por óbvio, sequer sabem distinguir entre a poesia, o conto e a crônica? Devem ser poucos os que se deleitam com a literatura e a compreendem. O livro, supus, não se sustenta. Desprezei-o.
O tempo passou. Vi alguns textos de Danilo Damásio no blog de Albert Piauí. -invoquei um deles em postagem aqui neste blog. E aí pensei: esse cara escreve melhor do que a opinião, desnecessária, vejo agora, da turma que antecede os seus textos em O encomendador de almas. E aí, dirigindo-se ao Bellobar, sem vontade de conversar com ninguém, entrei na Universitária, em busca de algum livro para acompanhar-me na cerveja.
O fato é que Danilo Damásio, em seu O encomendador de almas, exercita a crônica em sua essência: a partir de um gancho qualquer, promove reflexão sobre a atualidade, em visão crítica. Foi delicioso lê-lo: Danilo Damásio tem um humor extraordinário.
Eis uma crônica, que, não sendo a melhor do livro, é oportuna, considerando as últimas postagens:

"Como o Leão
perdeu os dentes

"Um leão se apaixonou pela filha de um camponês e a pediu em casamento. Como não queria dar sua filha a um animal selvagem a que temia dizer não, o camponês tratou de bolar um plano para sair da enrascada. Assim, declarou ao leão, que o pressionava insistentemente, que o considerava digno de casar com sua filha. Mas só lhe daria a mão dela sob uma condição: que arrancasse os dentes, pois eles a assustavam. O leão aceitou a proposta facilmente: estava apaixonado. Mas, em troca, conseguiu apenas o desprezo do camponês, pois, quando voltou desdentado, foi expulso a pauladas.
Esta pequena e milenar fábula do legendário Esopo ilustra bem o que está acontecendo nos dias de hoje aqui no Piauí. O povo, apaixonou-se pelo PT e entregou-lhe seus dentes: o voto. Desdentado e inofensivo, agora é tratado na base do cacete.
Só muita raiva de pobre (ou tem outra explicação?) justifica o esforço hercúleo que o governo tem feito para empurrar goela abaixo a famigerada 'taxa' do Detran. Cobrada de quem precisa de um financiamento bancário por não ter dinheiro para comprar à vista um veículo, a taxa foi criada de forma grosseiramente ilegal. O governo passou por cima das atribuições do Legislativo e, por portaria, chamou de 'tarifa' o que era taxa, precisando de lei, e começou a cobrar. Com valores que vão de 100 a 250 reais, a cobrança incide sobre todo contrato de alienação fiduciária realizado no território piauiense. Ou seja, pediu dinheiro ao banco para financiar, em todo ou em parte, a compra de um carro ou moto, é obrigado a pagar a taxa.
Que o Detran tivesse precisando de dinheiro, tudo bem. Mas fazer um contrato com uma firma de fora dando a esta 80% do valor cobrado e ficando apenas com 20% é, no mínimo, esquisito. Nem os negócios sujos, como a venda de cocaína dão lucro do 80%. Até por que a empresa contratada (FDI, Fidúcia Documentação Ltda) funciona dentro do Detran e não paga aluguel, água, energia, vigilância, limpeza e nem IPTU. Talvez nem telefone.
E o enredo desta cobrança é mesmo intrigante. Primeiro por ter sido feita uma licitação obscura, de um só participante, com datas inexplicavelmente alteradas e instruida com documentos suspetos por parte do participante vencedor. Isso não é tudo. O governo justificou a legalidade do resultado da licitação com um só participante argumentando o instituto da 'melhor técnica', previsto na Lei de Licitações. O interessante é que depois de assinar o contrato, a vencedora saiu subcontratando outras empresas para prestar o serviço. E não era ela a detentora de todo o know-how para papar a milionária licitação?
Não é tudo. Depois de ganhar a licitação, também, e assinar um contrato de 10 anos com direito a faturar no mínimo 100 milhões em todo o período, a empresa foi vendida para dois pernambucanos que, dizem, têm uma verdadeira holding de empresas prestando serviços para o Detran desde o comecinho do primeiro governo do PT: Cercapi, XF Consultoria, Up Grade Informática e ITCI. O valor da compra da empresa que estava com contrato milionário em mãos? Custou só 1% de tudo que vai arrecadar. Esquisito, hein?
Para quem não sabe, esta Cercapi, pertencente à holding dos pernambucanos, é a empresa contratada para emitir e renovar carteiras de motorista. Por ser uma empresa 'sem fins lucrativos', foi contratada sem licitação. O contrato é guardado a sete chaves no Detran e ganha um doce quem souber quanto ela fatura por mês.
Se fosse o governo do PFL ou do PMDB que tivesse bancando esta empreitada, todos, à frente os petistas, comunistas, socialistas e trabalhistas que hoje mamanm nas tetas do governo, lambendo os beiços e balançando o rabo, diriam tratar-se do maior esquema de corrupção armado na história do Estado e o circo já teria pegado fogo.
O governo precisa ficar atento apenas a um detalhe: o leão perdeu os dentes, mas não perdeu as garras. E, ao contrário do leão da fábula, os dentes do leão-povo (votos) são como dente-de-leite: nascem de novo, mais fortes e mais afiados."

Mais algumas observações:
1) a crônica Zé, eu te amo!, devotada ao seu cão, fez-me lembrar de imediato das crônicas de Carlos Heitor Cony dedicada à Mila, sua cadela, e evidencia, a despeito do que pensam alguns, que empresário tem alma;
2) as ilustrações postas no livro são de Aurimar e Moisés dos Martírios, Jota A e Paulo Moura;
3) a encardenação do livro é uma lástima - o meu está esfacelado -, como se a venda de O encomendador de almas fosse destinada ao Serviço Público.



Foto, sem crédito, extraído do Portal AZ.

3 comentários:

Airton Sampaio disse...

Eu também, Leonam, não entendi como um bom cronista como o Danilo Damásio (que deve saber mais ganhar dinheiro que escrever)cedeu tanto espaço para tanta gente ignorante dizer tanta besteira no Encomendador de Almas, para mim o livro de crônicas do ano. Teve até um que se despediu como "papai", pode? Se na segunda edição o autor não lançar fora essas opiniões terríveis e desnecessárias e não encadernar melhor os exemplares, aí, meu irmão, ele pode ser tudo, menos o bom cronista que é. A literatura é, como sabemos, uma bela mulher exigente!

Anônimo disse...

Obrigado pela crítica ao meu livro. A encadernação é mesmo uma merda, teria prazer de trocar seu livro por outro. Ele também é otimo para eliminar traças. Me mande seu endereço no damasio.danilo@yahoo.com.br que mandarei outro exemplar.
Abraços

Danilo

M. de Moura Filho disse...

Meu caro Airton,

Confesso que, depois da resistência por ocasião do lançamento, e graças ao textos publicados por Albert Piauí, conhecer O encomendador de almas, de Danilo Damásio, foi realmente delicioso.Tomara que novas crônicas sejam publicadas logo, sob o formato de livro - e agora, acredito, Danilo Damásio terá segurança para afastar as muletas, desnecessárias, que usou